2017 foi um ano de crise para a pecuária de leite. Em 2016, com preços bons, até fora da curva, o setor teve estímulo para aumentar a produção no ano seguinte. De janeiro a setembro, segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), a captação de leite cresceu 4,34%. O consumo, porém, caiu, principalmente fruto da crise econômica e política do país. As importações de lácteos, especialmente do Uruguai, também não ajudaram a situação do produtor. Com isso, os preços no campo recuaram 18,2% de janeiro a novembro na “média Brasil” (que inclui BA, GO, MG, SP, PR, SC e RS, não contém frete e impostos) do Cepea. Em novembro, a cotação ficou em R$ 1,0003/litro, menor patamar desde fevereiro de 2010. “Foi um ano atípico, porque o preço do leite também caiu no período de entressafra, que é normalmente quando os valores sobem um pouco e o produtor ganha fôlego”, diz Geraldo Borges, presidente da Associação Brasileira de Produtores de Leite (Abraleite).

 

“Foi um ano difícil, mas, para 2018, esperamos um aumento do consumo devido à recuperação da economia”, diz Rodrigo Alvim, diretor da Federação da Agricultura e Pecuária do Estado de Minas Gerais (Faemg) e presidente da Comissão Nacional de Pecuária de Leite da Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA). Sobre a produção, ele não espera grandes aumentos. “Ao contrário do ano passado, vamos entrar em 2018 com preços ruins, que às vezes nem cobrem os custos de produção”.

 

Borges concorda que o cenário não parece favorável para uma forte expansão da captação. “O que temos ouvido é que produtos usados na nutrição animal, como soja e milho, podem ter uma valorização, e isso aumenta os custos e pode inibir o crescimento da produção”, afirma. Ele espera um ano de preços melhores para o setor, também pelo trabalho que a entidade, criada há cinco meses, vem fazendo.

 

Entre os pleitos da Abraleite e de outras entidades do setor junto ao governo federal que foram atendidos, está a prorrogação de dívidas de 2017 de produtores de leite. “Muitos ficaram sem ter condições de pagar as dívidas por falta de recursos. Pedimos que fossem prorrogadas por mais um ano para que os produtores possam respirar”. A demanda foi atendida em partes. No caso de parcelas de custeio, 50% do valor poderá ser postergado, e 100% para as de investimentos. A medida ainda não está totalmente implantada, mas, segundo Borges, o vice-presidente de Agronegócios do Banco do Brasil, Tarcísio Hübner, afirmou que as agências do banco devem estar, a partir da semana que vem, em condições para atender essa demanda dos produtores.

 

Outra novidade é a criação de uma linha de crédito para investimento em estruturas de armazenagem de leite em pó e lácteos. Com isso, indústrias ganhariam alternativa para equilibrar a oferta com a demanda do mercado ao estocar os produtos. Em coletiva na inauguração da Embrapa Territorial, o ministro da Agricultura, Pecuária e Abastecimento, Blairo Maggi, também disse que o governo fará intervenções no mercado em 2018, como a compra de leite em pó para repasse a escolas. "Estamos pensando em políticas para o futuro. Precisamos intervir ou a crise do leite vai permanecer ano que vem", afirmou o ministro.

 

A Abraleite também tem atuado em nível estadual. No Nordeste, segundo Borges, a entidade conseguiu evitar a liberação de um entreposto na região para a Conaprole, cooperativa de leite uruguaia, o que abriria espaço para que o leite do país vizinho tivesse ainda maior circulação no país. Além disso, Maggi garantiu que as instruções normativas que autorizam reidratação de leite importado no Nordeste não serão renovadas. De acordo com Borges, a medida não é necessária, já que não há situação de desabastecimento no país.

 

Importação e acordos - As importações de outros países do Mercosul, principalmente do Uruguai, que foram suspensas por um período durante o ano por suspeita de triangulação, têm sido motivo de debates na cadeia. O setor pleiteia um acordo com o Uruguai nos moldes do já existente com a Argentina. “O acordo com a Argentina e o que queremos fazer com o Uruguai não é para proibir importação, mas, sim, ter previsibilidade. Não queremos surtos de importação, como, por exemplo, entrar 20 mil toneladas de leite em pó em um mês e ainda acontecer em momento de ‘safra’ brasileira com preços já mais baixos. Isso vai acabar com o produtor e até com a própria indústria, porque, muitas vezes, quem importa são as tradings”, explica o diretor da Faemg Rodrigo Alvim.

 

Segundo ele, quando o acordo com a Argentina foi definido, levantou-se a média mensal de importação dos últimos cinco anos para chegar a um número. “O valor foi de 1.704 toneladas/mês. Em um primeiro momento, demos cota de 3 mil toneladas. Não cerceamos nada, criamos até reserva de mercado para eles”. De acordo com Alvim, o acordo de importação com a Argentina preocupa. O documento vence em abril de 2018 e, com a falta de um termo similar com o Uruguai, os argentinos não parecem tão interessados na renovação. “No momento, eles não têm leite de sobra para mandar para cá, mas, quando tiverem, pode ser um problema para o Brasil, podemos ser inundados por leite de fora”.

 

Borges reforça que é necessário que produtores do Brasil e dos países vizinhos tenham condições iguais para poderem competir de forma justa. Entre os fatores para aumentar a competitividade, segundo o presidente da Abraleite, está a desoneração da cadeia. “Precisamos de um preço melhor com custo mais baixo para que o produtor tenha lucro com competitividade”, reforça.

 

Alvim acredita que, para ampliar a competitividade, também é necessário continuar avançando na melhoria da qualidade do leite nacional, na assistência técnica e na profissionalização e aumento de eficiência de todo o setor. “Nos tornarmos competitivos é a única forma de combater importação e até pensar em exportar. Somos um dos maiores exportadores de alimentos. Por que não no leite também?”.

 

Projetos - A associação também está trabalhando na proposição e monitoramento de leis relacionadas ao setor na Câmara e no Senado. Entre os projetos em andamento, estão a alteração em lei que coloca como obrigatoriedade a existência de contratos de fornecimento de leite entre indústrias e produtores - sem envolver cooperativas, que têm um modelo próprio de funcionamento. O contrato teria também aviso prévio para rescisão, ou seja, caso uma das partes decida deixar de fornecer ou comprar o produto, precisa avisar com antecedência.

 

Outra frente de trabalho é a proibição de aquisição de leite e derivados de outros países pelas esferas governamentais - federal, estadual e municipal. Esse projeto já foi aprovado na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania. A entidade também quer que o uso da palavra leite seja autorizado apenas para produtos puros ou derivados do leite, proibindo o nome para extratos vegetais, por exemplo.

 

Existem também dois projetos, um na Câmara e outro no Senado, que buscam obrigar igualdade de condições no Mercosul. “Isso já existe na teoria, mas não é obedecido. Os pecuaristas de leite brasileiros precisam cumprir diversas obrigações e têm carga tributária maior do que a dos outros países do Mercosul, o que cria uma desigualdade de competição”, afirma Borges. (Portal DBO)

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